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Descrição: Profissional de saúde segura bebê após vacinação. Proibida a reprodução. |
O escritor português Valter
Hugo Mãe disse certa vez que é o desejo de construção que impulsiona nossa
vontade de viver e que todo o reto seria desperdício de tempo e vida. Existir é
ser impulsionado a buscar permanentemente soluções para problemas que não
apenas nos atingem diretamente mas, sobretudo – pelo menos para alguns – criar soluções
para desafios reais ou, porque não, ainda
nem presentes no cotidiano da existência coletiva. Para além disso, penso que
estar presente de corpo e alma no fluxo da aventura humana, seja principalmente
se importar com o sofrimento do outro. Vivemos até agora, antes dessa
catástrofe causada pelo Covid, gravitando e nos importando apenas com nossos
umbigos. Muitas vezes desperdiçando nosso tempo com problemas inexistentes,
criados por nossa tendência a nos deixarmos
levar por medos irracionais ou fantasias de nossa imaginação.
Penso, claro, com imensa
tristeza, nas milhares de existências ceifadas por essa pandemia. Cruzo com
vizinhos que me olham com medo se tusso uma ou duas vezes no hall do elevador.
E mesmo, vejo alguns que desistem de pegar o mesmo elevador. Para além de todas
as orientações de saúde pública – e talvez seja mesmo prudente tentar embarcar
no elevador sozinho – vejo que o medo assume proporções para além disso. Muito
embora entrar em um elevador sozinho não signifique que se vá saltar dele sem
companhia. A vida é assim, nunca sabemos quem vai entrar no próximo pavimento.
E cada vez que a porta se abre vamos encarar o desconhecido. Mesmo em nossas
moradias onde deveríamos, pelo menos em teoria, conhecer todos os nossos
vizinhos.
O que me leva a pensar
nos milhares de profissionais de saúde, segurança pública e demais atividades
essenciais que perderam suas vidas tentando fazer exatamente isso: se importar
com o sofrimento do outro e tentar solucionar problemas reais e imediatos que
ameaçam toda a população mundial. Penso
nas tantas vezes que estive em hospitais e reclamei da demora no atendimento,
nos rostos desanimados – ou que me pareciam indiferentes – dos profissionais
que por ali circulavam. Me esquecia – ou melhor – nem sabia do que estava por
vir. Não achava provável, para além dos filmes de ficção científica que veria,
em minha existência, problema semelhante ao atual.
Os rostos cansados, a
falta de paciência de alguns profissionais me remetia apenas à minha dor do
momento. Que queria ver sanada de maneira exata e com brevidade. Não prestava a
atenção que aquelas pessoas lidavam diariamente com problemas reais de saúde –
muitos até que matavam e ainda matam mais que o próprio Covid, porém de maneira
mais lenta e portanto, não tão perceptível e alarmante. Dramas diários que
essas equipes enfrentavam, fossem pelas mortes inexplicáveis ou brutais, pela
falta de equipamentos ou recursos, pelo descaso das autoridades públicas de
saúde. E perder um paciente, ver o sofrimento do outro, não importa se em hospitais
particulares com estrutura adequada, ou em hospitais de campanha em uma guerra
tem o mesmo impacto psicológico para quem cuida da vida. E se importa com a existência
do outro.
Mas, como na imagem que
ilustra esse artigo, cedida gentilmente por uma amiga, profissional de saúde
preventiva, que aparece na foto feliz ao vacinar uma criança, vejo um fio de
esperança. E torço para que em breve a ciência ache a cura ou a vacina que faça
estancar essa tragédia. E que essa criança, já protegida por soluções
encontradas por médicos e cientistas que viveram suas existências pensando no
bem comum, tenha uma vida longa, feliz e saudável – assim como a técnica de
enfermagem que a vacinou. Ainda nos resta a esperança. E hoje, ela está
depositada nas mão que seguram com acolhimento e coragem esse bebê.
Para a Silvia e todos os
profissionais que nesse momento nos acolhem arriscando suas próprias
existências.
Marcelo Ruiz
Marcelo Ruiz
Brasília, 22/05/2020.
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