domingo, 21 de março de 2021

Pandemia: uma imagem vale mais que mil palavras...



Essa matéria nem precisaria de texto. A imagem acima fala por si. Mas quem gosta de escrever não resiste a publicar um artigo apenas com uma foto. Em meados de janeiro desse ano, muitos países, inclusive Brasil e Portugal, sofreram uma escalada na pandemia de Covid. Provavelmente pela proliferação de novas variantes do vírus, relaxamento das medidas restritivas de circulação antes e após as festas de Natal e Ano Novo. Aqui no Brasil ainda houve o carnaval com aglomerações clandestinas. Em todo o mundo a pressão das pessoas cansadas dos confinamentos também faz pressão. As empresas já muito prejudicadas financeiramente pelos confinamentos, mesmo que parciais leva ao declínio econômico e desespero de seus proprietários.  Todos esses fatores fazem pressão sobre governantes e autoridades sanitárias. Houveram então desconfinamentos considerados precoces e temerários. Médicos, cientistase autoridades sanitárias alertaram para o risco. Não foram ouvidos. Isso ocorreu na quase totalidade dos países. Em muitos países a população se rebelou violentamente contra medidas sanitárias e de restrição á circulação e com o fechamento das diversas atividades econômicas. Não foi um caso isolado ou que tenha acontecido de maneira pior no Brasil.

Inclusive, nesse início da vacinação contra a Covid, ainda existem países onde a população é mais reticente quanto às vacinas e sua utilidade e segurança. Em muitos desses países onde não há um sistema estatal robusto e amplamente capilarizado como temos no Brasil com o SUS, referencia mundial nessa e em outras áreas de medicina gratuita e universal, programas de vacinação em massa estão sendo montados às pressas, mesmo em países desenvolvidos. Não por falta de redes de saúde pública. Em muitas nações desenvolvidas, diversas vacinas, principalmente para doenças tropicais e outras como a tuberculose não fazem parte dos calendários oficiais pela baixa incidência ou erradicação das mesmas. Inclusive em alguns, certas vacinas não são oferecidas gratuitamente. Nesse aspecto nosso país tem talvez o melhor e mais abrangente sistema de vacinação universal e gratuita do mundo. Mas a falta de vacinas impede o uso da capacidade total de inoculação que dispomos.

Embora a vacinação contra a Covid esteja mais adiantada em alguns países, a produção mundial do imunizante ainda apresenta gargalos. Algumas nações garantiram inclusive muito mais doses que a quantidade necessária para imunizar todos os seus cidadãos.  Pois se adiantaram a pagar por elas, ainda na fase de pesquisa, quando nem se sabia se funcionariam. Mas a entrega das doses, na União Europeia, por exemplo, têm enfrentado atrasos por falta de capacidade de produção, problemas técnicos e demora de autorização para uso dos imunizantes de alguns laboratórios. Também fica claro que algumas empresas prometeram e venderam mais do que podiam efetivamente entregar. É o capitalismo sendo capitalismo. Essa demora em vacinar rapidamente a população mundial tem levado ao recrudescimento da pandemia. Novas vagas surgem em muitos países. E parecem estar ligadas ao surgimento das perigosas variantes do vírus.

O que eu descrevi até agora foram similaridades que ocorrem globalmente. Mas a forma como as diversas nações e seus habitantes encararam, gerenciaram e desenvolveram ações de combate a pandemia, desde o início, foram bastante diferentes entre si. Em situações opostas está hoje o Brasil e quase todo o restante do mundo. Tornamo-nos o pior país em termos de evolução de casos, testagem, hospitalizações, índices de transmissibilidade, óbitos e falta de estrutura hospitalar. Estamos sendo alvo de criticas, chacotas, piadas na comunidade internacional. Mas, principalmente, estamos ficando isolados do mundo. A variante P1 de Manaus causa pavor lá fora. A forma como o governo negacionista e incompetente do coveiro-mor conduz a política de enfretamento da crise, desde o início da pandemia, nos colocou numa situação vergonhosa e temerária aos olhos do mundo. O isolamento político e ideológico, representado pelo discurso insano do coveiro presidente e seus admiradores, gerou antipatia e descrédito na comunidade científica e nos governos mundo a fora.

Em política internacional há de tudo, menos inocência e desconhecimento. O mundo sabe que não somos mais um país subdesenvolvido, pobre e sem recursos. Afinal chegamos a ser a sexta economia do mundo por um breve período. Os organismos econômicos mundiais sabem que temos capacidade financeira para comprar vacinas e outros insumos de saúde. Sabem que temos (ou tínhamos até o agravamento da crise) uma estrutura universal e gratuita de saúde para atender aos doentes. Portanto não devemos esperar ajuda humanitária e outros subsídios econômicos, que muitos países realmente pobres e com estruturas de assistência à saúde precárias, principalmente na África, Oriente Médio e Leste Europeu estão recebendo. Os escândalos políticos, a corrupção sistêmica, as leis confusas, a burocracia estatal, os interesses no manejo com fins políticos e eleitoreiros dessa pandemia dificultam as negociações possíveis com nações e empresas que mantem sempre um pé atrás em tratativas com nosso país.

Apesar desses fatores, não chegamos onde estamos por falta de interesse absoluto desses países e empresas em negociar com o Brasil. No caso das vacinas, ofertas de compras e tratativas foram oferecidas desde meados de 2020, quando a epidemia estava mais controlada e os laboratórios desenvolvendo e testando os imunizantes. E o governo federal, fez todas as apostas erradas e mesmo demonstrou pouco interesse em negociar. Inclusive emitindo declarações ofensivas e descabidas. Frases como “é apenas uma gripezinha”, “eu não sou coveiro”, “a vacina do jacaré” e outras atitudes de nosso coveiro-mor irritaram e ofenderam governos e instituições. E levaram a boicotes velados no envio de vacinas ao Brasil e ainda atrapalham a conclusão de acordos de cooperação e transferência de tecnologias de fabricação e produção de vacinas no território nacional.

Talvez nosso (in)governante pensasse, que poderia seguir as ideais do defenestrado Trump, do qual é confesso admirador. Só se esqueceu que entre Brasil e Estados Unidos, um abismo de poderio econômico, político e militar separam a capacidade de reverter situações e constrangimentos. Os EUA conseguiram converter rapidamente a estagnação do processo de vacinação, da subida desenfreada de mortes e numero de infectados, não apenas pela mudança do presidente. Certamente o carisma e as posições políticas de Joe Biden facilitaram as coisas. Mas o que contou mesmo para que lá o processo de imunização e ações de enfrentamento econômico avançassem rapidamente depois da posse do novo presidente foi o peso da economia americana e sua influência geopolítica no mundo. Afinal qual país ou laboratório se negaria a vender a eles as quantidades de vacinas que quiseram comprar? E mesmo as empresas e instituições de pesquisas americanas não foram impedidas de fazer pesados investimentos e acordos de cooperação interna e externamente, quando se iniciaram as pesquisas sobre vacinas.

Para encerrar esse artigo, tomo como exemplo Portugal. Não vou fazer comparações com o Brasil. As diferenças de extensão territorial, população, localização geográfica e inserção em uma poderosa comunidade como a União Europeia, tornam difícil a comparação estatística. Com a imagem que ilustra este artigo, quero apenas mostrar números comprovados no país ibérico. Portugal, que inicialmente parecia conduzir bem a pandemia, se viu em meados de janeiro desse ano, na pior posição mundial em termos de pandemia. Em números relativos obviamente. Mas em pouco mais de dois meses, conseguiu passar do caos nos hospitais, com UTI´s lotadas, filas de ambulâncias com doentes a espera de leitos, indicie de transmissibilidade (Rt) descontrolado, número de novos casos diários mais altos em todo o período da pandemia, para uma situação dentro do controle. O governo português tomou medidas enérgicas no final de janeiro e a população e os empresários, mesmo não concordando totalmente, acataram e respeitaram o decreto de lockdown total. Não vou me estender aqui, porque prefiro que, como o título desse artigo indica, prefiro que a imagem fale por si. Basta olhar os números no lado vermelho e verde da bandeira de Portugal que usei no gráfico. E aos mais atentos deixo a ressalva que as cores da bandeira foram invertidas propositadamente, com A faixa vermelha passada para o lado esquerdo. Na bandeira oficial o verde fica do lado esquerdo. Os números absolutos não são elevados como no brasil e em outros países. Mas como disse no início do parágrafo, a população do país é de pouco mais de 10 milhões de habitantes. Então as internações e mortes, para o contexto demográfico, eram muito altas.

Embora a vacinação já possa estar mostrando resultados, o número de vacinas aplicadas e o tempo decorrido da aplicação não podem explicar a queda vertiginosa do número de casos, internações e mortes. Médicos e infectologistas acreditam que foi realmente o confinamento rigoroso e o respeito da população em seguir as normas estabelecidas, mesmo à custa de enormes sacrifícios financeiros, que conseguiram reverter a situação gravíssima para patamares seguros. O que chama a atenção é que o governo português, ao impor o confinamento rigoroso no final de janeiro, informou previamente aos cidadãos os parâmetros que precisavam alcançar no dia 15 de março passado, quando o governo começaria a discutir o desconfinamentos em fases. E o mais significativo foi que, longe de ilações e projeções não alcançadas, como acontece a cada semana no Brasil, a meta prevista lá foi alcançada dois dias antes do prazo previsto e com todos os parâmetros até abaixo dos inicialmente previstos.

Ou seja: a ciência e a razão sempre devem prevalecer. Vacinas funcionam, como já se pode ver inclusive no Brasil. O que chamam de resultados da vida real, em alguns casos superam até as previsões obtidas nas fases de testes das vacinas. Mas esse processo, como acontece com todas as vacinas já criadas, não é tão rápido e visível como outras ações profiláticas. As medidas de higiene, o distanciamento social, a testagem e rastreio de casos e principalmente o confinamento rigoroso e bem acompanhado, são a primeira linha de defesa em caso de catástrofes causadas por doenças contagiosas com alto grau de propagação. São elas que evitam mortes, colapsos no sistema de saúde e dão tempo a ciência de pesquisar e encontrar a cura e tratamentos profiláticos para os agentes causadores das doenças. Em nosso país teremos que esperar e confiar na queda dos números propiciados pela vacinação em massa. O problema disso é que dolorosamente veremos ainda centenas de milhares de mortes acontecerem e a economia derreter antes do alívio.

Conforme alertam os cientistas e médicos, mesmo com a vacinação atingindo o maior número de pessoas possível, aqui ou em qualquer outra parte do mundo, o vírus SarsCov19 não desaparecerá. Mas a forma como conviveremos com ele, ou seja, o controle de casos e as mortes decorrentes da doença ainda se farão sentir por muitos anos. Como acontece com todas as outras doenças para as quais, mesmo por décadas, as vacinas estão sendo usadas. Erradicação total de doenças infectocontagiosas são casos raros na medicina.


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