quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Igualdade e equidade: resumo da ópera em 10 atos...


Leio no Fronteiras do Pensamento um artigo do economista Thomas Piketty (que pode ser lido aqui), falando sobre a persistência da desigualdade de renda entre 2001 e 2015. Pincei do texto dez constatações dos autores do estudo que proporcionam uma visão lúcida do porquê, mesmo após 15 anos de políticas sociais alardeadas como o meio de acesso a um país com distribuição de renda justa e equilibrada e erradicação da pobreza, nos encontramos na mesma situação de quase duas décadas de sua implantação:    

1 - A maior parte do crescimento econômico neste século foi apropriada pelos 10% mais ricos da população;
2 - Esses 10% mais ricos ampliaram sua participação na fatia da renda nacional em 1% passando de 54,3% para 55,3% de 2001 a 2015;
3 - A participação da renda dos 50% mais pobres também subiu 1 ponto percentual, passando de 11,3% para 12,3%.

4 - A renda nacional total cresceu 18,3% no período analisado, mas 60,7% desses ganhos foram apropriados pelos 10% mais ricos, contra 17,6% das camadas menos favorecidas;
5 - A expansão foi feita à custa da faixa intermediária de 40% da população, cuja participação na renda nacional caiu de 34,4% para 32,4% de 2001 a 2015;
6 - Essa camada da população não se beneficiou diretamente das políticas sociais e trabalhistas dos últimos anos nem pôde tirar proveito dos ganhos de capital (como lucros, dividendos, renda de imóveis e aplicações financeiras), restritos aos mais ricos.
7 - A renda média dos 90% mais pobres no Brasil é comparável à dos 20% mais pobres na França;
8 - Em contrapartida, o 1% mais rico no Brasil ganha mais que o 1% mais rico no país europeu.
9 - O PIB brasileiro cresceu cerca de 40% entre 2001 e 2017, mas esse crescimento não foi corretamente distribuído de forma a diminuir a desigualdade e propiciou apenas mais concentração de renda entre os 10% mais ricos.
10 - Um crescimento médio de 2% ao ano, muito inferior a outros países em desenvolvimento, que não pode ser suficiente para fazer frente ao aumento da população, à inflação e ao aumento da valorização de moedas estrangeiras e as crises econômicas que se sucederam nesse período. 

No final, esse libreto triste de ópera bufa, pode ser resumido em dois pensamentos. O primeiro, que de falhamos em desenvolver e manter programas de desenvolvimento capazes de gerar crescimentos bem mais altos do PIB em um modo sustentável.  Lembrando que em países onde esse crescimento foi altíssimo e acima da média por décadas, mas não atentado para a sustentabilidade, a queda foi inevitável. Cada vez mais dependemos de exportar produtos em natura e industrializado de baixo valor agregado, pelo desmonte generalizado da pesquisa científica, do investimento e educação e reformas do sistema tributário e regulatório de abertura de novos negócios. 

A segunda razão é a manutenção da distribuição da riqueza. Garantida por leis inadequadas ou por outro lado, adequadamente criadas para favorecer a continuidade desse modelo econômico. Não é puro acaso que representantes das maiores fortunas, ou membros das famílias detentoras, ocupem as cadeiras do Congresso Nacional e dos altos órgãos da administração pública por décadas seguidas. Desde a proclamação da república, criam, votam e aprovam leis que protegem seus interesses. Mesmo os governos populistas com sua maquiagem de representantes dos mais pobres e discriminados, falharam ao terem que obrigatoriamente ceder espaço aos grupos detentores do poder econômico. E infelizmente acabaram entrando no jogo da corrupção em troca de interesses. 

A igualdade e a justiça social, apesar de serem valores morais e imateriais, são regidos por leis matemáticas. Só se pode distribuir  se houver o que dividir. Mesmo de maneira igualitária. E o que é dividido só aumenta em quantidade se houver aumento, na mesma proporção do total a ser distribuído. Fora isso, tentar dividir um bolo insuficiente para todos causa a mal intencionada igualdade. A ilustração inicial desse artigo demonstra de forma bem simples e clara essa equação. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigado por sua participação. Seu comentário será respondido brevemente.